"Tens tanta sorte!" - dizem-me. "Como religioso, tens tempo para estudar, meditar, podes rezar, estar mais perto de Deus…". E têm razão. Mas pergunto: quem disse que ser pai ou mãe significa estar mais longe de Deus?
São vocações diferentes e, de certa forma, incomparáveis. Mas, se virmos bem, um pai ou uma mãe, participam não só com o espírito mas com o corpo todo na Criação. Primeiro, biologicamente, gerando uma nova vida (nisto as mães têm privilégios especiais e intransmissíveis que nós, homens, nunca iremos compreender).
E, depois, humana e espiritualmente, participam também contribuindo o melhor que sabem para o desenvolvimento dessa vida. Como barro nas mãos do oleiro, um pai ou uma mãe, tem a oportunidade de mergulhar no mesmo acto criador de Deus: dar a descobrir a um filho a beleza da vida e a sua contribuição particular para o bem do mundo.
Então, vê-lo dormir, brincar com ele no chão da sala, recebê-lo de braços abertos depois da corrida do fundo do pátio, ouvir as suas pequenas grandes perguntas, fitar aqueles olhos cheios de novidade, dar-lhe banho, todo e qualquer pequeno instante torna-se forma de oração.
É descoberta de toda uma liturgia que toca fundo a vida. Mesmo que imerso em actividade um pai ou uma mãe vive em contacto permanente com o íntimo das coisas. Como diz o Pe. Vasco Pinto de Magalhães, "quando nasce uma criança, nasce também um pai e uma mãe". Por isso, é também uma oportunidade para se nascer de novo: re-aprender a maravilha do olhar lavado sobre o mundo, confrontar-se com a inocência (e também com a maldade sem filtros!), espantar-se com a densidade humana posta em cada segundo. Ter a liberdade de se tornar diferente.
E não é isto a espiritualidade?
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